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11. Teologia ecológica da criação

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04.02.2016 | 4 minutos de leitura
Solange Maria do Carmo
Diversos
11. Teologia ecológica da criação

Uma das reflexões teológicas mais consistente e original em torno da questão ecológica, tão em voga no mundo atual, surge de uma releitura dos textos da criação feita por Moltmann, grande teólogo protestante.


Sua teologia muito contribui para se repensar a relação existente entre Deus e o mundo criado. A originalidade da reflexão moltmanniana consiste em desenvolver a doutrina ecológica da criação a partir do conceito trinitário de pericorese, ou seja, da relação interna e profunda entre as pessoas da Trindade, e em reler o relato da criação (Gn 1,1-2,4) como um hino sabático e não como uma teologia do trabalho.


A partir do princípio de pericorese, Moltmann entende todas as coisas criadas num nexo não-mecanicista, mas de comunhão, à luz do Deus Trino. O dinamismo relacional das três pessoas da Trindade passa a ser princípio de inteligibilidade para se pensar a criação de Deus, pois Deus, ao criar, doa a si mesmo e, assim sendo, sua criação só tem plenitude nele.


A partir desta nova ótica, supera-se a compreensão tradicional que separava Deus e mundo. Numa tentativa de fugir do panteísmo, a teologia anterior afirmava a total transcendência de Deus diante do criado e via o mundo apenas como lugar da sua divina ação benevolente. Eliminava-se assim a imanência de Deus, pois sua presença no mundo era colocada sob suspeita.


Esse tipo de teologia, aliada à nova releitura do Gênesis, tem suas consequências. A primeira e mais imediata delas era percebida na antropologia teológica. O ser humano – imagem de Deus – era entendido como centro da criação, como aquele que é seu senhor e deve subjugá-la.


Moltmann vai dar uma virada nessa compreensão. Para ele, a criação de Deus é para sua glória e o ápice de sua criação não é o ser humano, mas o sábado. Seguramente a humanidade ocupa um lugar importante na criação, mas o horizonte não é mais de uma luta do homem com a natureza. O relacionamento do ser humano com a criação passa a ser visto na perspectiva do descanso sabático e da festa. E assim, o homem, considerado dentro da grande criação de Deus, é convidado ao louvor ao Criador, juntamente com todas as criaturas.



Obras do Senhor, bendizei todas ao Senhor,

Louvai-o e exaltai-o eternamente.(Dn 3, 57)



Nesta ótica, a relação de domínio cede lugar a uma relação de comunhão. Como o Deus Trino não está separado de sua criatura – ele não cria de fora, distante, mas cria a partir de dentro e continua presente, agindo na criação – não há mais espaço para dominação e exploração da natureza. Deus está no mundo e o mundo em Deus, numa verdadeira relação pericorética. Ele é imanente e transcendente ao mesmo tempo. Ele cria, mas não abandona sua obra. Ao contrário, ele a conserva, sustenta e leva-a à consumação. Enquanto a relação de domínio leva o homem ao pecado, distanciando-o de Deus, a comunhão leva-o à glória. Moltmann insiste que o ser humano não foi criado para dominar, mas para fazer comunhão, pois Deus é comunhão e relação em si mesmo. Assim, o conhecimento, que antes era entendido como fonte de domínio, passa a ser compreendido como participação e integração no dinamismo da vida. A pericorese da Trindade, sua harmonia relacional interna, é modelo da relação primeira entre todas as criaturas.


Partindo dessa relação trinitária, Moltmann afirma também a inter-relação entre as criaturas: a biodiversidade presente no cosmos. É no fato de Deus ser trino e poder se relacionar em seu próprio interior que se encontra a condição de possibilidade de toda diversidade. Pois não há nada, nenhum princípio presente na criação, que não encontre sua condição de possibilidade no seu criador. O Espírito de Deus se derrama sobre todas as criaturas e lhes dá o sopro da vida. Assim, derramado sobre o mundo, o Espírito da Trindade gera a comunhão dos seres criados – do mais insignificante fungo ao homem, cuja inteligência é tão elaborada! E, como fonte de vida, o Espírito de Deus continua animando a criação e encaminhando-a para a santificação – o sábado eterno, o futuro do tempo messiânico, em que toda a criação se tornará morada plena de Deus.