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94. A privacidade dos pobres

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24.08.2017 | 4 minutos de leitura
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94. A privacidade dos pobres

Todo mundo tem direito à privacidade. Coisa ruim é quando a gente se sente invadida, bisbilhotada, como uma peça de roupa exposta numa vitrine de loja ou um bicho raro exposto num zoológico! Há coisas que só fazem sentido na intimidade, no segredo, no escondimento, como fazer as necessidades fisiológicas, fazer sexo ou tomar banho. Não que haja algo de vergonhoso ou imoral nessas atividades, mas é que nossa cultura convencionou que as partes íntimas (as genitálias) não devem ser expostas. Aprendemos desde pequeninos que os órgãos sexuais não devem ficar à mostra e que andar pelado na rua é atentado ao pudor. Outras culturas pensam e agem diferente. Mas, uma vez feita a convenção acerca da intimidade de certas atividades, precisamos defender esse direito para todos.


Ando preocupada com o aumento do número de moradores de rua: homens, mulheres, jovens, crianças que já nasceram na rua... Uma coisa assustadora! Por mais de uma vez, já assisti à triste cena de ver algum desses peregrinos evacuando num canto qualquer da rua, à vista de olhos curiosos e atônitos. Para aumentar minha perplexidade, assisti, num dia desses, o ritual do banho de dois mendigos fazendo uso de uma pequena torneira pública de um parquinho perto de minha casa. Não havia quem não olhasse. Parecia um espetáculo. Os caminhantes pararam de caminhar; as crianças pararam de brincar; as mães pararam de vigiar seus filhos... E os dois cumpriram seu ritual cultural, sem se deixar intimidar. Fizeram um rito, como se fosse um culto. Tiraram as vestes e ficaram apenas com a calça ou bermuda; lavaram suas roupas com sabão, escova e muito cuidado; tiraram uma bolsinha com o material de higiene de uma sacola; pegaram a água da torneira com um vasilhame improvisado (pote de sorvete) e se lavaram com uma reverência, como se não houvesse nada mais digno e prazeroso na vida. Apesar da água gelada, não gritaram, nem pularam, nem xingaram... Demonstravam gozo e alegria, mais nada.


Além do desconforto da água fria e das condições precárias para o “banho de cavalo” (quando se joga a água no corpo com um vasilhame), maior para mim era o desconforto da invasão de privacidade. Nossa gente perdeu quase tudo, até a privacidade do banho. Só ainda não perdeu a alegria de viver e a coragem para seguir em frente.


Diante de cenas como essa, me lembrei de Francisco – o papa. Ele tem sido apóstolo incansável na defesa dos direitos desses pobres abandonados. Por diversas vezes, Francisco surpreendeu o mundo, acolhendo-os no Vaticano, saindo ao encontro deles nas ruas e até mandando construir banheiros em áreas da Igreja, de forma que os moradores de rua possam se banhar com um mínimo de dignidade, sem ficar espalhando mau odor pelas ruas, coisa que os constrange e aumenta a repulsa da população por essa pobre gente.


Já passou da hora de nossas paróquias seguirem o exemplo do bom pastor, Francisco. Não custa tão caro! Não é tão difícil! Na maioria das paróquias, espaço não falta! Um pouco de dignidade para nossa gente, já tão explorada e humilhada, não é má ideia. Que tal investir um pouco do dinheiro do dízimo no esforço de promover vida digna pra essa gente? Bom seria mesmo, se nossa fraternidade cristã fosse suficiente para acolher a todos e a lhes oferecer condições de viver num teto decente. Mas, infelizmente, confesso que – sem a iniciativa do governo, que aliás só piora as coisas – fica quase impossível dar conta dessa tarefa. Enquanto tiramos um da rua, a corrupção generalizada dos governantes e a política excludente de nosso país jogam mais cem no fosso do abandono. Então, se não estamos vendo uma saída, que tal pelo menos ajudar esse povo (já é um povo, uma população) a viver com um mínimo de dignidade? Banheiro com chuveiros quentes e sanitários podem ajudar a diminuir o desconforto dessa gente. Acho que está na hora – ou já passou – de colocar essa ideia em prática.


Aos leigos dos conselhos paroquiais, aconselho colocar essa causa na pauta das reuniões. Aos párocos, aconselho disposição para seguir Francisco e coragem para enfiar a mão nas finanças da paróquia. Com pouco dinheiro e muita caridade dá para fazer muita coisa. Fica aí a dica.  







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