2. Pentecostes juvenil


O Pentecostes descrito em Atos 2, com tons de transbordamento do Espírito e exagero da parte da assembleia, parece ser um bom ponto de partida para falarmos da catequese juvenil, sempre exagerada e exuberante nas suas manifestações. Lucas não poupou cores fortes para pintar o quadro da efusão do Espírito: vento, barulho, fogo, línguas... Certamente símbolos de teofanias já descritas no Antigo Testamento, especialmente aquela acontecida no Sinai. A festa de Pentecostes, que antes comemorava a colheita e a alegria dos primeiros e abundantes frutos, ganhou sentido novo com o decorrer do tempo. Passou a significar a festa da entrega da Torá, por meio de Moisés, ao povo. Os judeus entenderam que o fruto novo e abundante com o qual Deus os alimentava era sua palavra e não os grãos colhidos no campo. Vento, fogo, barulho... Para Lucas, Deus continua se manifestando como outrora para comunicar (línguas) aos seus (a Igreja nascente) a sua palavra que alimenta e gera comunhão. Apesar de descrever um público de origem judaica (judeus da diáspora – cf. At 2,5), que deveria estar acostumado a este tipo de linguagem, o autor sagrado não deixou escapar que tanta espontaneidade e liberdade fossem alvo de críticas de alguns mais comedidos e racionais – a ponto de dizerem: “Estão cheios de vinho doce!” (At 2,13).
Como em pentecostes, as assembleias de jovens causam certamente algum estupor e admiração (cf. At 2,12). O barulho dos encontros juvenis cheios de exuberância e de suas canções em volumes sempre alto nos irritam. O frescor de suas ideias nada presas às tradições, e que como o vento nos escapam, parece dizer que não temos mais o controle da situação. O fogo de seu vigor e de sua jovialidade, insistindo em queimar a frieza de nossas liturgias e pedindo para aquecer nossos encontros, nos fazem pensar que arrefecemos no primeiro amor (cf. Ap 2,4). E ainda mais: suas línguas ferinas e espontâneas a dizer muitas vezes o que não queremos ouvir, a recusar nossos ensinamentos prontos – sem dialogar com eles – e a pleitear direitos que insistimos em negar-lhes também nos incomodam. Vai ser difícil ver nossa juventude retomar seu espaço na Igreja sem reagir como aqueles que estavam do lado de fora do Cenáculo: “Estão bêbados e não devem ser levados a sério!”. De alguma forma, já passamos por isto, quando fomos às ruas lutar contra a ditadura ou quando enchemos nossas comunidades eclesiais com o sangue novo de uma pastoral militante. A diferença é que, em tempos de pós-modernidade, nossos jovens não militam em prol de uma causa social ou da utopia do Reino, mas em prol da experiência de Deus que lhes foi negada, na utopia que a comunhão com Deus é possível em qualquer tempo. Já passou da hora de pagarmos a nossos jovens a conta que eles estão cobrando: o déficit de iniciação cristã que deixamos como rastro na nossa pastoral católica.
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