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190. Ou isso ou aquilo

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13.09.2018 | 4 minutos de leitura
Frei Abdias Júnior OFMCap
Crônicas
190. Ou isso ou aquilo
 

“Ninguém pode servir a dois Senhores” (Mt 6,24)



“Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!


Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!


Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.


É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares.”

(Cecília Meireles)


 

O Cristianismo em sua origem traz uma dupla novidade sócio-religiosa: uma verdadeira revolução! A primeira novidade, a partir de Jesus, muda-se a forma de ver Deus. O Deus revelado por Jesus se mostrou um Deus próximo, misericordioso e todo amor. A segunda, muda-se o modo de a gente se relacionar com o Deus.


Jesus demonstra com sua vida um jeito de ser e de viver. Ele se sensível a tudo e a todos que lhe cercavam, revela-se atento às injustiças cometidas com os pequenos e marginalizados da sociedade.


Jesus inaugura uma outra lógica, a lógica do amor. A partir dessa lógica não adianta somente cumprir os ritos religiosos; é preciso conversão, é preciso amar o irmão, é preciso comprometer-se com a vida dele. Não basta participar dos cultos, das celebrações e fazer vista grossa às necessidades do próximo. Mas, como o escriba do evangelho, para nos esquivar do compromisso, poderíamos nos perguntar:  “E quem é o meu próximo? ” (Lc 10,30). Jesus responde contando a parábola do bom samaritano, aquele que foi capaz de aproximar-se do homem caído. Próximo é todo aquele que se aproxima do outro, que reconhece em cada pessoa a sua dignidade, que se sente interpelado por seu rosto sofredor.  Próximo é aquele capaz de estender a mão a quem precisa.


Jesus apresenta a face misericordiosa de Deus, a face que os doutores da Lei já haviam esquecido e que, deixada de lado, fê-los cair num legalismo morto, estéril, incapaz de gerar vida.  Onde a lei é a única forma de se fazer ouvir, aí não há vida e nem dignidade. A lei existe para servir e não para aprisionar e fazer reféns, tampouco para legitimar autoridades.


Como pode um seguidor do Mestre compactuar com a cultura do ódio, se tudo que ele nos ensinou foi perdoar e buscar sempre uma nova chance de seguir, se ele nos ensinou a viver o amor acima de todas as coisas?  Diante da mulher adúltera, quando escribas e fariseus corrompidos pelo legalismo querem fazer justiça com sangue nos olhos, Jesus mostra um novo jeito de pensar. Perdão, bondade, acolhida em vez de ódio, justiça legal e exclusão. “Quem dentre voz não tiver pecado atire a primeira pedra!” (Jo 8,7).  Este é Jesus de Nazaré, o filho de Deus: ensina a superação do legalismo e capacita-nos para o amor misericordioso do Pai.


A experiência com o Mestre de Nazaré gera em nós um ardente desejo de amar, de semear a paz e a fraternidade. Não se pode aderir ao evangelho sem aderir aos irmãos, sem aderir à luta pelo bem comum. Onde o evangelho é a inspiração não há lugar para privilegiados de alguns poucos em detrimento do sofrimento de muitos:  “Aquele que diz amar a Deus e não ama seu irmão é um mentiroso”(Jo 4,20).


Ou acolhemos o Deus de Jesus que está do lado da dignidade humana e do direito de vida plena para todos, ou estamos contra ele. Toda vez que deixamos um dos menores morrer sem socorro e sem cuidado, estamos contra Jesus e seu Reino. Todas as vezes que nos calamos contra a injustiça e a cultura do ódio, não estamos com o Ressuscitado. Todas as vezes que compactuamos com a morte de pessoas LGBTs, de índios, de negros, de prostitutas, de pobres etc., estamos condenando à cruz mais um inocente. Qual é o perfil do cristão? O que defende somente os seus interesses ou aquele que defende a dignidade da vida? Não há como estar entre os seguidores do Mestre e alastrar a cultura do ódio e da morte. Ou servimos o Senhor da vida ou servimos a nossos interesses mesquinhos.