56. Não há Eucaristia sem Palavra


A Palavra de Deus é alimento,
tal como nos inspirou Jesus
Antes de chegarmos à mesa da ceia eucarística, é preciso que passemos, com uma parada fundamental, na mesa da Palavra. Não se trata de um simples passar, alheios; mas de que nos deixemos encontrar e ser atravessados por essa Palavra. O Pão eucarístico foi, antes, Pão-Palavra. Não é este, pois, um dos grandes anúncios feitos pelo evangelista João: o de que a Palavra se fez carne? E, mais ainda, de que se alimentar desse Pão-Palavra seria critério para que permanecêssemos em Jesus Cristo, o Filho de Deus?
Algumas comunidades têm o privilégio de ter um evangeliário ?" o livro dos evangelhos ?" que, solenemente, é introduzido na procissão de entrada e permanece sobre o altar até à aclamação ao Evangelho, quando ele será, também solenemente, levado à mesa da Palavra. Essa ritualidade, com ar solene, não deve nos passar despercebida: há um aspecto de sacramentalidade nisso, que nos aponta para a presença do próprio Cristo, Palavra encarnada. O evangeliário é, pois, símbolo da presença de Jesus Cristo no seio da comunidade, tal como o pão e o vinho eucaristizados também o são, bem como a assembleia reunida e aquele que preside a celebração. O evangeliário deve ser guardado e cuidado, do mesmo modo como cuidamos e guardamos o Santíssimo Sacramento.
Nas últimas semanas, por meio deste espaço, temos discorrido sobre os processos que nos levaram a uma hipervalorização do pão e do vinho eucarísticos, e que acabaram por diminuir a importância de outros elementos fundamentais que também manifestam, sacramentalmente, a presença de Cristo. Esse é o caso da Palavra. Fora algumas comunidades, que bem cuidam da Liturgia da Palavra com algum esmero, seria possível que disséssemos, com alguma confiança, que o modo de cuidar da mesa da Palavra seja o mesmo daquele dispensado ao altar da eucaristia? Não tenho dúvidas a respeito da resposta.
A Palavra proclamada é Cristo! E não há, pois, eucaristia, sem Palavra. Mais: não há sacramento sem a Palavra. No batismo, por exemplo, se se tira a Palavra, têm-se apenas um banho. A refeição eucarística é, para além da comunhão no pão e no vinho eucaristizados, uma manducação de e da Palavra. O momento no qual estamos vivendo, de isolamento social, no qual a maioria absoluta dos fiéis está privada de celebrar, presencialmente, a Eucaristia, é um momento oportuno para redescobrirmos a força da Palavra na vida cristã. Esse tempo em que estamos retirados da presença do altar se mostra como oportunidade de que deixemo-nos encontrar com a Palavra de Deus, que é o próprio Filho.
A Palavra de Deus é alimento, tal como nos inspirou Jesus: não só de pão vive o ser humano, mas da Palavra que sai da boca de Deus. Ao mesmo tempo em que nos alimenta, a Palavra trabalha nosso desejo: se, pois, a mesa da Palavra é caminho necessário e incontornável para o acesso à mesa da Eucaristia, saborear o Pão-Palavra educa nosso desejo para que saboreemos, com maior qualidade, o Pão-Eucaristia. Muitos dos problemas, pois, que vemos ocorrer por causa de exageros em relação às espécies eucarísticas seriam resolvidos se vivêssemos uma experiência com a Palavra, em seu lugar sacramental. Nesse tempo de isolamento, que as paróquias redescubram seu papel catequético: para além das missas transmitidas, que sejam criativas e didáticas em oferecer um profundo e transformador encontro com a Palavra, fundamento da vida cristã.
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